sexta-feira, janeiro 27

«só mais um.»


Puxo o maço e penso em silêncio no meio da solidão à qual já estou habituada, «só mais um.». Tiro o isqueiro, acendo e olho fixamente aquele pedaço de droga a arder rapidamente na minha mão, invadindo todos os meus órgãos com os vários tipos de substâncias mortais que contém. Vagueiam agora pelos meus pensamentos a tua imagem, depois de uma longa reflexão e de vários minutos mascarados de eternidades a estudar cada traço teu, dou por mim a comparar-te a um simples cigarro, tão inocente e inofensivo por fora mas completamente mortífero por dentro. Uma droga que me consome o interior, que me vicia cada vez mais e mais. «só mais um.», ecoa na minha cabeça, só mais um pouco, um pouco de muito. Não. Não é suficiente, mesmo lúcida que tenho de parar, que me destrói por dentro, quero mais, afinal faz sentir bem, ou aparenta. Arde por fora, queima por dentro, e vai diretamente para o órgão mais vital de todos. Implacável, frio, Rei da vaidade, príncipe da subtileza, veste a perfeição, dono do orgulho e da própria razão, vestido a rigor, com a coroa bem no centro desse poço de racionalidade, tu não sentes, pensas. Manipulador e teimoso, tem qualquer tipo de poder sobre mim e comandas-me a teu gosto, seja ele qual for. Afinal sempre foste rei de Rei de algo, sempre reinaste, apoderaste-te do reino mais difícil de todos, o meu. E agora (?) Façam a vénia ao Rei. 
Apago o cigarro, respiro fundo e inalo o resto do fumo tóxico que paira no ar. «só mais um.» apesar de saber que nunca vai ser, só mais um.

1 comentário:

Descritos de mentes cheias de memórias são sempre bem-vindas.